Educação e Sociedade em Rede
A VIRTUALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS
O fenómeno dos Chinese Boys constituiu um tremendo sucesso
internacional típico da rede social You Tube e que só o
advento desta tornou possível. O sucesso dos registos videográficos deste grupo
de jovens chineses foi posteriormente alargado nos últimos anos, ao ser
disseminado noutros outros canais de partilha de vídeos na rede. Todavia, o
vídeo acima reproduzido foi o primeiro apresentado pela dupla e aquele que
acabou por gerar o início do grande fenómeno de popularidade dos «rapazes
chineses» especialistas em imitações de estrelas pop internacionais. Na
verdade, pela análise do registo, torna-se evidente a con-fusão entre distintos
valores culturais e societais que caracteriza o mundo virtual da rede. Nesta
comédia de enganos, quem é afinal quem? Quem são estes rapazes? Será que
importa sabê-lo? Não são eles precisamente para a rede apenas os «chinese boys»
que a rede produziu? Qual é, então, a sua verdade?
A questão da autenticidade da rede ultrapassa em muito a trivialidade deste
divertido exemplo. No entanto, ele desde logo abre-nos variadas pistas. Quem
são e como são verdadeiramente esses outros que encontramos na rede? Que são
eles por detrás das máscaras que constroem na rede? Que somos nós de nós
próprios na rede? Somos ou poderemos ser transparentes? São as imagens que de
nós partilhamos autênticas? Que dizem de nós? Tudo? Nada?
Por outro lado, como poderemos assegurar a autenticidade da informação?
Pela sua transparência? Quem a valida ou autentica? Quem o poderá fazer? A
própria comunidade, a propria rede? Será pela transparência dos processos de
partilha? Como e em quem na rede poderemos confiar? Como se poderá garantir a
qualidade da informação e como se poderá garantir a idoneidade da utilização
dessa informação?
A atividade que vos propomos seguidamente comporta duas fases distintas.
Assim, primeiramente, entre 07 e 15 de dezembro, deverão pesquisar textos e
informações relevantes sobre o tema em análise. Depois, a atividade culminará, entre 16 e 21 de
dezembro, na publicação individual de posts com as conclusões-síntese nos vossos blogues
respetivos. Não se esqueçam que deverão indicar no fórum de debate
especialmente criado para este tema o(s) link(s) para o(s) vosso(s)
blog post(s)
Eu vivo na “rede”. Eu sou sempre eu, na rede ou fora dela.
Mas eu, não sou os outros!
Confesso
a minha dificuldade em realizar esta tarefa…não por ser uma tarefa dificil, não
é, mas exatamente por não ser, não me apetecia fazê-lo. É um pouco ter que
escrever o óbvio. Infelizmente, o óbvio, também tem que ser explicado pois o
que é óbvio, não o é para todos.
Refleti
e resolvi ´entrevistar-me’ a mim mesma. E porquê? Porque eu vivo ligada às
redes e, portanto, a minha imagem prolifera pelas mesmas.
Será
que a imagem que dou de mim mesma é falsa? Ou seja, será que eu não sou quem
sou?
E
mais… será que na vida real (entenda-se, não virtual pois real é tudo o que
somos), não acontece o mesmo?
Isto
leva-nos à noção de máscaras e à noção do eu. Quantas máscaras ou quantos eus
quero mostrar!? Somos sempre iguais consoante os meios, contextos, pessoas?
Claro que não. Somos e mostramos partes de nós, aquelas que consideramos serem
importante para aquelas pessoas, naqueles contextos.
Então,
a ser assim, qual o motivo de termos que ser diferentes virtualmente?
Nenhum.
A grande diferença é que virtualmente é mais fácil enganar. Apenas e só.
Pegando
no exemplo dos Chinese Boys- não pretendem ser mais do que aquilo que mostram.
Uma brincadeira que os diverte e nos diverte. E quem somos nós para
interrogarmos sobre quem são eles? Eles pretendem ser mais do que aquilo que
mostram? Não. Não me parece, são o que mostram, são o que querem ser. A questão
da autenticidade/transparência é importante na rede mas é uma questão basilar
da natureza humana e que se coloca em todas as relações interpessoais (virtuais
ou sem ser). Naturalmente que este exemplo ‘cómico’ é um ponto de partida para
outras questões mais complexas.
O
que sou neste curso mestrado é uma parte de mim. E sou o que devo ser no
sentido em que este é um meio formal, académico e apenas mostro uma parte de
mim. Não faria sentido mostrar mais nada. Existem aspetos da minha
natureza/personalidade que não cabem neste contexto e não é por isso que não
sou transparente nem autêntica e que aquilo que “mostro” não corresponde ao meu
eu. Claro que corresponde, mas sou muito mais do que aquilo que mostro neste
contexto específico. Chegada aqui, a este momento do meu eu, preciso de
recorrer a Ricardo Reis:
Vivem
em nós inúmeros;
Se
penso ou sinto, ignoro
Quem
é que pensa ou sente.
Sou
somente o lugar
Onde
se sente ou pensa.
Tenho
mais almas que uma.
Há
mais eus do que eu mesmo.
Existo
todavia
Indiferente
a todos.
Faço-os
calar: eu falo.
Os
impulsos cruzados
Do
que sinto ou não sinto
Disputam
em quem sou.
Ignoro-os.
Nada ditam
A quem me sei: eu escrevo.
(13-11-1935Poemas de Ricardo Reis. Fernando
Pessoa. (Edição Crítica de Luiz Fagundes Duarte.) Lisboa: Imprensa Nacional –
Casa da Moeda, 1994. – 182)
Se
vivem em nós inúmeros eus como afirma e bem o poeta, temos que nos pautar por
comportamentos diferentes na rede? Porquê?
O meu raciocínio
alicerça-se então no seguinte:
1-
A Rede mostra o que queremos que mostre
(uma parte de nós), não significando que não sejamos transparentes;
2-
A Rede potencia o engano devido ao
anonimato;
3-
A Rede mostra facetas da natureza humana
e, por conseguinte, não podemos esperar dela o que ela não pode dar/ser, ela
limita-se a refletir o que os homens são ou querem ser/mostrar.
Partindo
destes três aspetos, alicerço o meu pensamento.
Acrescento
a estes axiomas que os diferentes domínios da nossa existência estão na rede.
Felizmente vivemos numa sociedade mediada pela tecnologia, tornando o longe
perto, facilitando interações e relações pessoais e profissionais.
A
pandemia foi disso exemplo. Melhor ou pior interagimos e trabalhámos online
(alguns de nós) e nem por isso deixámos de ser quem somos.
No
plano pessoal / familiar; no plano profissional; na vida social, académica, não
há domínio da nossa existência que não possa ser virtualizado. Exemplo desta
virtualização das relações sociais são as amizades que se criam num curso desta
natureza, entre pessoas que nunca se viram ao vivo mas que estabelecem laços
profundos entre si.
O
facto de habitarmos um mundo cada vez mais tecnológico isso não significa que o
Ser Humano mude a sua natureza.
Basta
elencarmos alguns comportamentos impróprios/disruptivos para percebermos que a
tecnologia é apenas uma porta escancarada ao embuste.
Segundo
Pedroso “Vivenciamos novos tempos, com novos desafios, relativos a questões
antigas: as questões éticas!” (2013, p.1).
É
disto que se trata. Toda a problemática que nos foi colocada, radica em
questões éticas. As pessoas não traíam antes das relações sociais passarem para
o mundo online? Traíam. Não é necessário efetuar-se um inquérito para isso. As
pessoas não adotavam comportamentos de Bullying sem a existência da Web/Redes?
Claro que sim. Com as relações sociais a ocorrerem através da web, passámos a assistir
ao incremento deste comportamento. As pessoas não roubavam antes do surgimento
das redes? Claro que roubavam. As pessoas não fingiam ser quem não eram antes?
Fingiam. Então qual é a diferença?
A
diferença está na possibilidade acrescida de qualquer um se poder passar por
outro através de um ecrã e, por conseguinte, ser mais dificilmente apanhado. Quem
valida? Pergunta-se? A própria rede? Nalguns casos sim. Os processos de
partilha? Idem.
A
qualidade da informação e idoneidade da utilização dessa informação? Ética
Ética, Ética e Educação. Ou seja, só é possível boas relações interpessoais
virtuais se estivermos alerta para a sua origem.
Existem
formas de nos assegurarmos da autenticidade do outro.
Pesquisas
bem feitas na Web permitem detetar rastos. Um dos aspetos que falha no
curriculum tem a ver com a necessidade de se educar para a “Rede”, de se
prevenirem comportamentos disruptivos. Tal como as questões da integridade
académica ou ausência dela só se resolvem através de- 1. Educação; 2.
Policiamento, também as questões do embuste que a Rede e a virtualização das
relações sociais na mesma acarretam só poderão ser dirimidas desta forma. A
sensação de impunidade tem que ser eliminada.
A
este propósito, existem alguns programas de TV com esse objetivo (caça ao
embuste), um deles a que já assisti e que se chama 'Catfish: “The TV
Show'"Catfish", analisa esse mundo de relacionamentos virtuais
repletos de ilusão e de mentiras.” Neste programa que
basicamente é um programa de detetives privados modernos utilizando o rasto que
deixamos na rede, procuram-se incongruências para apanhar os enganadores.
A
verdade é que somos produtos, mas também somos produtores de conteúdos. Cada
vez que criamos um post, cada vez que partilhamos uma informação e
acrescentamos a nossa visão sobre essa informação, estamos a criar conteúdos. “Começamos
assim por olhar o modo como as redes sociais estão desenhadas para criar e
manter vínculos com outros, e como este enfoque na sociabilidade faz delas um
espaço privilegiado para a representação do “eu” em ambientes digitais.”
(Ferreira, 2014.p.76)
É
sabido que criamos a nossa identidade. Segundo Ferreira (2014) é nas redes
sociais que criamos o nosso eu.
A
questão colocada nesta tarefa é a da transparência. É a procura dessa
transparência que empregadores procuram na rede. Segundo Walters (especialista
em recrutamento profissional)
“Existem vários
casos de pessoas que perderam os seus empregos com base em comentários ou
publicações feitas no Facebook, por isso, mesmo depois de conseguir o emprego,
seja cauteloso na forma como usa esta plataforma. Este não é o meio para tecer
considerações negativas sobre o seu local de trabalho. Se algo o estiver a
incomodar, fale diretamente com o seu superior para tentar resolver a situação.”
(n.d. n.p.) Acrescenta o autor que a rede profissional considerada como válida
pelos empregadores é o Linkedin, sendo vistas como inadequadas tanto o Facebook
como o Twitter.
Vivemos num admirável
mundo novo que nos traz diversos desafios no plano ético.
Tal como o avanço na
biotecnologia necessitou e necessita de patamares Éticos, também as Redes ou ´A
Rede’ necessitam dessas balizas e da criação de orientações e comissões que
validem ou não determinados comportamentos, não numa perspetiva normativa mas
reflexiva.
A Ética mais uma vez é
chamada a assumir um papel crucial na evolução do Ser Humano, mas desta feita
no mundo virtual.
Concluindo, discordamos
desta posição pois não resolve nada, sendo apenas um placebo para um problema
de grandes dimensões:
“No
que diz respeito à autenticidade foi criado o Regulamento Geral de Proteção de
Dados, que veio impor algumas regras principalmente no que diz respeito à
obrigatoriedade de autorização explicita e informada na forma de registo de
dados pessoais, consentimento obrigatório para a transmissão de dados a
terceiros, a proteção de dados de indivíduos falecidos, autorização do
tratamento de dados por parte de terceiros (incluindo de menores), e inclusivé
os limites da videovigilância. No entanto, apesar de se dar mais poder e
autonomia e poder aos cidadãos, ainda não são visíveis nem claros os efeitos
deste regulamento.” (Cunha, M.Z., Sunday, A. E Magano, J.,2019, n.p.)
Educação,
vigilância, Ética, a trilogia que defende a Virtualização das Relações Sociais,
da transparência e da autenticidade.
Não
julguemos a Web ou a cibercultura pelas falhas do Ser Humano.
Referências
Bibliográficas
Catfish
https://www.google.com/search gs_ssp=eJzj4tLP1TfIs6jKK88wYPQSKCjKTy9KzE1USE4sScsszgAAl_0KYw&q=
programa+catfish&oq=Programa+Cat&aqs=chrome.2.69i57j0j46j0l5.5902j0j15&
Cunha,
M.Z., Sunday, A. E Magano, J. (2019.), A Virtualização das Redes Sociais
segundo o Pensamento de Manuel Castells e Pierre Levy. Comunicação
& Mercado/UNIGRAN - Dourados - MS, vol. 07, n. 15, p. 01-10, jul-dez 2019.
https://www.researchgate.net/publication/338234424_
A_Virtualizacao_das_Redes_Sociais_Segundo_
o_Pensamento_de_Manuel_Castells_e_Pierre_Levy
Ferreira, Gil (2014) Rostos do Facebook -
a formação da identidade nas redes sociais. Exedra Revista Científica Nº9-ESEC,
2014 http://exedra.esec.pt/wp-content/uploads/2015/04/n9-B4.pdf
Pedroso, Paula (2013), O papel disruptivo da abundância informativa no espaço escolar- para uma ética da aprendizagem http://hdl.handle.net/10400.2/2660
Walters, Roberts, (n.d) Redes sociais e o
processo de recrutamento
https://www.robertwalters.pt/conselhos-carreira/redes-sociais-processo-recrutamento.html
Etiquetas: #mPeL(ESR) 2020, A Virtualização das Relações Sociais